sexta-feira, 31 de maio de 2013

Cautela antes de brindar ao novo ministro do STF

Assim que a notícia da nomeação do novo membro do STF circulou entrei no site do nomeado para descobrir quem é o escolhido. O advogado constitucionalista e professor Luis Roberto Barroso defende casamento entre pessoas do mesmo sexo, aborto dos fetos anencefálicos, pesquisas com células tronco e defendeu Cesare Batistti. Vai muito bem nas questões estritamente morais.

Preocupou-me seu posicionamento nas questões econômicas e “de mercado” que em última instância definem as condições de opressão na sociedade. No site pessoal do novo ministro, http://www.luisrobertobarroso.com.br/, temos acesso a seus pareceres e descobrimos que o advogado recém-nomeado trabalhou recentemente para setores importantes da economia.

Para o governo do RJ, por exemplo, defendeu a tese da inconstitucionalidade da lei que definiu a nova divisão dos royalties do petróleo. Esta lei, ainda que tenha problemas, estendeu a todos os estados os benefícios de uma riqueza do povo brasileiro (o petróleo do pré-sal), ao invés de transformá-la em privilégio de dois ou três estados, dentre os quais seu cliente o Rio de Janeiro.

Advogou também recentemente para a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas para quem escreveu tese defendendo a constitucionalidade da publicidade de produtos com alto teor de açúcar, gordura ou sódio (sal), utilizados indiscriminadamente pelas empresas do ramo como forma de reduzir custos e aumentar lucros.

Tal prática é reconhecida pelas autoridades de saúde pública como comprovadamente causadora de uma epidemia de obesidade infantil no Brasil. Utilizou o argumento de que proibir qualquer publicidade seria um tipo de censura e ataque à liberdade de expressão e que, portanto, outras formas de precaução devem ser propostas. Não sugeriu nenhuma.

Luiz Roberto também escreveu tese contra a possibilidade do Ministério Público participar de investigações criminais. Para isto, tentou sair pela tangente. Sustentou que a Constituição não permite nem proibe, mas como a polícia está subordinada ao Ministério Público que pode em tese controlá-la. Quem controlaria o Ministério Público? Portanto, conclui o jurista, é preciso regulamentar o assunto e assim concluindo abre caminho para a tramitação e aprovação da chamada PEC da Impunidade.

Um de seus últimos trabalhos foi defender a utilização de terminais portuários privados para uso público. Embora pareça uma bobagem aos menos avisados, tal medida na prática tem o significado jurídico de permitir a privatização dos portos recém-aprovada pelo Congresso.

Segundo a legislação vigente, empresas que utilizam portos para transporte de seus próprios produtos, podem manter terminais privados exclusivos, mas não podem prestar serviços a terceiros. É uma meia privatização.

A medida defendida por Luis Roberto atende os interesses dessas de transformá-los em terminais privados prestadores de serviços altamente lucrativos e se associarem com as grandes operadoras internacionais. É a privatização total.

Estes são alguns posicionamentos do novo Ministro do STF no campo econômico acerca dos quais não li nenhuma referência nos elogios feitos a ele pela mídia em geral. Talvez não sejam importantes.

Há outra coisa intrigante para dizer o menos. Quem conhece o “mercado jurídico” sabe que cada parecer de um jurista de renome capaz de influenciar julgamentos em tribunais, como os recentes trabalhos do Senhor Luis Roberto, custa de R$ 500.000,00 a R$ 1 milhão ou mais, pois envolvem possibilidades de lucros infinitamente maiores para os interessados contratantes.

Ainda que tais valores possam ser maiores, fiquemos com eles pois são suficientes para concluirmos o raciocínio. Ministros do STF, como é sabido, devem ter dedicação exclusiva à magistratura, sendo-lhes vedada a atuação em escritórios de advocacia onde poderiam ser contratados para elaborar pareceres.

Do fundo de minha ingenuidade, fico admirado com o desprendimento de pessoas que abrem mão de uma situação financeira extremamente confortável para encarar, como um sacerdócio, uma carreira que vai restringir seus ganhos a menos de R$ 250.000,00 líquidos anuais que é o salário de um ministro do STF.

Para que se tenha ideia do tamanho dos interesses envolvidos nos portos, por exemplo, saibam que um Prático (profissional que guia os navios na entrada dos portos) ganha em média por mês o que um Ministro do STF ganha em um ano. Já fiz um documentário sobre portos e afirmo que o prático é um pequeno peão no grande jogo de lucros dos operadores do setor.

Há quem diga que homens íntegros sabem agir de acordo com a posição em que se encontram. Enquanto advogado, Luis Roberto tem a obrigação ética de defender os interesses de seus clientes, mas enquanto membro de um Poder do Estado, defenderá o interesse público.

A dúvida que me assalta é se uma mesma pessoa pode seguir uma ética quando servir ao mercado e outra quando servir ao interesse público. Sempre pensei que Ética fosse uma coisa única.

Como votará Luis Roberto quando o STF julgar a constitucionalidade da propaganda de produtos prejudiciais à saúde? Como votará na ação que vai questionar a privatização dos portos? Como votará na ADI que questiona a nova repartição dos royalties do petróleo? Saberá separar as coisas? Saberá separar o interesse público do interesse de seus antigos clientes? Saberemos em breve, embora então já seja tarde para criticar.

Talvez digam que é um vício esquerdista achar que o sistema capitalista pode ser a causa da degradação moral por que passa a sociedade humana. Talvez seja ingenuidade minha não perceber o quanto de bom o novo ministro vai trazer ao STF, o que é perfeitamente possível e não me envergonha.

Mas, por prudência, antes de abrir espumantes para comemorar a nomeação do “Defensor de Direitos Humanos” parece ser conveniente olhar melhor para a totalidade dos fatos que compõem a história deste senhor.

É conveniente também atentar para o fato de que a nomeação de ministros de tribunais superiores no Brasil de hoje, longe de configurar a busca de pessoas com “notável saber jurídico e reputação ilibada” como reza a Constituição – seja lá o que isso for – nada mais é do que um ato de repartição do poder entre as forças econômicas que dirigem a política.

De qualquer forma, sem nenhuma pretensão de ser dono da razão, lanço minhas preocupações como mera provocação na expectativa de ouvir em troca argumentos inteligentes capazes de construir conhecimento o mais próximo possível da realidade a respeito do novo Ministro e, quem sabe, erguer minha taça para brindar. Por enquanto, em respeito à dúvida, mãe da sabedoria, suspendo o juízo e deixo a taça sobre a mesa.

Caio Teixeira - Jornalista

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Imprensa Vigilante, sociedade em marcha e as pombas no balaio

Maior demonstração não há de que, para o Poder, pouco importa imprensa, cidadão ou entidade e organização vigilantes. 

Na página 8 do Diário Catarinense de 20 de Maio, numa daquelas famosas matérias para alisar egos, o DC diz que a RBS produzirá série sobre o Pacto por Santa Catarina. 

Primeira, é ela falando dela mesma. Segundo: o pacto por Santa Catarina é obra do atual governador com o seu governo. 

Quem nasceu na Coxilha Rica prefere ver turista passeando em cavalinhos em lugar de convocar o morador do andar de baixo para um tal “governo participativo”. Mofas com a pomba no balaio, povo!

A matéria do DC, cujo título diz que a RBS produz a série, já de cara informa no lide que o RBS Notícias exibe nesta semana... Bom, produzir vem antes de exibir, suspeita-se. E o leitor que se dane. 

O lide explicita que a série se dá pelo um ano do anúncio do Pacto e que as reportagens registram o que está acontecendo em todas as regiões do Estado (até mesmo em Maracajá, Turvo e Paial? Duvido).

A primeira matéria da série, no caso apresentada dia 20 de Maio pela RBS TV, mesma data em que o título da matéria do DC afirmava que a série seria produzida, traz um fato que é digno de estar logo nas primeiras linhas porque, da técnica jornalística é realçar de pronto a importância do morto, ou o número de mortos. 

Pois não é que a primeira matéria da RBS TV exibiu “os avanços em Infraestrutura”, conforme o texto original, “onde...” (sic) – onde? Lugar? 85% das ordens de serviço já foram assinadas!!!

Dois anos e meio de governo, um ano de Pacto e o governador já assinou 85% das ordens de serviço!!!  Não foi trabalho demais, não? Depois desta comovente notícia que afeta a vida de todos nós, catarinenses, resta perguntar se ele conseguirá assinar as outras 15% de ordens de serviço faltantes antes de começar a cata por votos para a próxima eleição...! E a pomba, no balaio, a mofar!

Como não poderia deixar de ser, a matéria da RBS TV, conta o DC, também afirma que há motivo pelo qual o Pacto não anda e os gargalos que não se desfazem. O jornal não apresenta os tais problemas. O leitor que se vire e a pomba que se empombe. 

No dia 21, relata o jornal, a RBS apresentaria matéria sobre um tal Regime Diferenciado de Contratações. A ideia deste Regime é que o governo possa “driblar” (sim, isso mesmo, foi esse o termo utilizado) a burocracia para que as obras saiam do papel. 

A abertura de 3 mil vagas no sistema prisional seria uma das soluções viáveis pelo Regime Diferenciado. A matéria também  não explica como.

A matéria do DC avança com precisão, afirmando que quarta-feira, dia 22, serão abordados os desafios que o programa (o Pacto) enfrenta nos próximos meses.


Pois bem: a matéria ilustra algumas inutilidades. Uma delas, a da falta de coisa real na própria matéria. A outra, que este governo da Coxilha Rica assina ordens de serviço a rodo e tem imaginação para driblar a burocracia (deve ser a própria burocracia, ou seria a do Tribunal de Contas?). 

 Enfim, que nos próximos meses seremos bem informados sobre o Pacto. Será? A partir pela demonstração, acho que não. 

Afinal de contas não se deve usar tantos “pode”, “deve”, “vai” e quetais em texto jornalístico. 

Ou será que a Imprensa Vigilante só tem um olho, e justo e coincidentemente aquele que agrada apenas ao governo...

Rubens Lunge - Jornalista