sexta-feira, 12 de julho de 2013

O despertar dos que não estavam dormindo

A responsabilidde pelos avanços é de todos Juntos.
Foto: Rubens Lunge

O 11 de junho marcou a retomada das mobilizações unitárias da classe trabalhadora. Em Florianópolis estavam lá sindicatos e movimentos que há muito tempo não mobilizavam juntos, na defesa bem objetiva dos direitos dos trabalhadores e de suas organizações. No carro de som falaram centrais sindicais, sindicatos, partidos de esquerda, movimentos e organizações sociais. 

Os da direita não falaram porque não estavam lá. Não participaram da convocação por que nunca o fizeram. Seu principal partido, o poderoso Partido da Imprensa Golpista atuou, como sempre, para criar uma imagem da realidade ao gosto dos interesses da sua classe. Durante toda a semana pudemos ler nos jornais notícias sobre uma suposta Greve Geral que não era objeto da convocação. Se não foi convocada provavelmente não aconteceria e as manchetes poderiam falar do “fracasso da Greve Geral convocada pelos sindicatos” um bom argumento para quem gostaria de ver sindicatos e bandeiras vermelhas bem longe das ruas.

O que se viu ontem foi a retomada de uma prática que estava em desuso. A velha e producente prática da unidade. Foi uma espécie de despertar dos que sempre estiveram acordados, um dia de protesto concentrado na pauta dos trabalhadores, esses que somos a ampla maioria dos cidadãos neste país, mas somos minoria no poder do Estado.

O ponto principal para mudar esta correlação artificial de forças é mudar o sistema eleitoral. Todas as organizações presentes defenderam uma reforma política. Proibir os financiamentos privados de campanha, por exemplo, é dar um salto no combate à corrupção e à sonegação de impostos pelos mais ricos que tem por principal ferramenta o caixa dois das empresas.

Outro salto no mesmo sentido é a utilização de plebiscitos que deveria ser a regra para tudo. Quero votar SIM à revogação da reforma da previdência, ao fim dos leilões do petróleo, à regulação da mídia, ao fim do financiamento privado de campanhas. Quem é contra? Golpe é referendo. O povo tem que decidir, não referendar. Esta deveria ser uma das grandes bandeiras, mas alguns setores confundem a importância de defender esta forma direta de participação popular com “uma manobra da Dilma”. A direita fechou em bloco contra qualquer plebiscito. Curiosamente também vimos algumas faixas contrárias assinadas pelo PSTU.

O 11 de junho foi marcado também por um combate mais agressivo contra o oligopólio da mídia. Em São Paulo manifestantes cercaram a sede da Rede Globo num protesto contra a manipulação da informação que vem se repetindo nos últimos tempos por todo o país. Em Porto Alegre os manifestantes pela Democratização da Comunicação espalharam uma carga de esterco na porta da RBS, para simbolicamente devolver o que eles nos jogam diariamente pela tela. A bandeira por um marco regulatório da comunicação é fundamental e deve ser levantada cada vez mais por todos.

É preciso registrar também a violência da repressão indiscriminada especialmente no Rio de Sérgio Cabral e em São Paulo de Alkmin. Os manifestantes tem sido atacados com força desproporcional. O Rio de Janeiro está se trnaformando num Estado sem leis em que o maior infrator é o aparato de repressão policial. Nada disso passa na mídia. Procure informação na mídia alternativa de confiança e lute junto por um sistema público de mídia capaz de enfrentar as empresas privadas.

Há dez anos, desde a eleição do Lula e a Reforma da Previdência, não se via tantas organizações de trabalhadores superando suas divergências e se empenhando juntas em mobilizar prá valer. Este foi o grande salto do 11 de junho. Precisamos preservar esta unidade e fazer crescer cada vez mais a mobilização pautada clara e objetivamente pelas bandeiras da classe e deixando de lado divergências que podem esperar seu tempo certo. Depois de aprendermos todas as lições deste momento, o que foi certo, o que foi errado e o que faltou fazer, poderemos começar a falar em Greve Geral. A responsabilidade por avançar é de todos JUNTOS.

Caio Teixeira - Jornalista

terça-feira, 2 de julho de 2013

E toda aquela gente na rua?


Vimos nas últimas semanas uma massa de gente nas ruas. Misturadas, politizadas, acríticas, diferentes e uma coisa só. Protestos marcadamente "ordeiros". Influenciados pela mídia que os concebeu como vandalismo e depois como atos de cidadania. Espontaneamente conduzidos, pautados por política e indicativo de alguma coisa que (não) ousamos a determinar. Da pauta consistente ao esvaziamento do pensamento democrático, o movimento sofreu rápidas transformações, tomou corpo e começa a definhar.

Articuladas conscientemente pelo MPL, as manifestações pela redução das tarifas do transporte público tomaram proporções impensadas para atos políticos organizados nos últimos dez anos. Da pauta exclusiva outras apareceram. De toda a ordem, de toda a natureza. Do fascismo ao socialismo. Da mais retrógrada à mais avançada. Infelizmente, nem toda a população está tomada de politização consciente, mas tê-la nas ruas é sinal de que há uma lacuna na disputa de ideias e não temos o direito de deixá-la por fazer.

Penso que nesses últimos anos o Brasil melhorou. Ter mais gente na universidade, ter mais gente na classe média, ter pessoas com mais acesso às coisas é bastante importante. Quando se quer dois, um é a metade e isso é estar em movimento, sair do lugar. Poderia descrever quanto a minha própria vida mudou, comparar por exemplo como uma jovem filha de professora acessa à universidade em 2013 e o conjunto de possibilidade que ela tem em medida das que eu tive em 2002. Tudo isso é excelente, mas a história não é estanque e o que queremos é ainda muito mais. Se quer tem nome, diz a poetiza.

O fato de havermos avançado não pode ser motivo para pensarmos que já chegamos ao fim. Ainda há miséria, ainda há a exploração do homem pelo homem. A história nos impele a caminhar. Cabe a nós conduzi-la para frente e para o avanço. E isso só será possível com ação consciente, constituída a partir do debate de ideias para além do momentâneo.

Se há erro em nossa atuação nos últimos anos, ele se materializa em nossa dificuldade de, em paralelo às imprescindíveis análises conjunturais, imprimirmos claramente nossa concepção. As ações imediatas só se justificam dentro de perspectiva perene, em que pautamos o avanço desse para um outro modelo de sociedade, discussão da qual não podemos nos furtar.
 
O relatório, os comparativos e os debates imediatos são fundamentais para consolidarmos um posicionamento político, mas é no debate de ideias, de concepções, que garantimos o entendimento do porque seguir esse ou aquele caminho. Se tem um sinal que esse povo nas ruas nos dá é que quer saber para onde ir, que procura uma perspectiva que justifique essa ou aquela ação. E cabe a nós, que pretendemos chegar a determinado lugar, mostrar esse caminho. Com humildade, mas muita efervescência.

Nesse ponto, vejo que duas coisas são muito importantes. A primeira é paciência, a hegemonia do pensamento fragmentado está fortemente constituída entre nós. Nossas práticas a refletem, afinal não contemos o mundo, estamos contidos nele. Portanto, nosso pensamento ainda está em defensiva e nós mesmos, na prática, não o reproduzimos, atuamos conforme as características do pensamento hegemônico. Veja como é difícil travar a luta de ideias. Muitas vezes nossas ações nos contradizem.

Convencimento fraterno é a segunda necessidade. Como já disse este texto, não nos basta apresentar relatórios e comparativos da realidade brasileira se queremos ganhar corações e mentes. É preciso politizar, é preciso apresentar o fundo das relações. E são coisas que se fazem transversalmente. Convencimento, da figura e do fundo. Com humildade. Coragem, luta, obstinação caminham com ela. Humildade não é sinônimo de subserviência, é capacidade de diálogo.

Essa gente bonita na rua traz para a cena um pouco de tudo, como a janela aberta por onde entra o ar puro e uma leva grande de insetos. O fascismo e o atraso das palavras devem ser combatidos, mas é preponderante atuar sobre a realidade escancarada, sem rejeitá-la. A mim, as pessoas nas ruas são reflexos de que o povo quer mais. A pergunta que se impõe: o que diremos nós a ele?
 
Clarissa Peixoto - Jornalista

Imagem: Portal de Notícias UOL

quinta-feira, 20 de junho de 2013

O povo não acordou ontem.

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Um amigo, preocupado, me disse que este movimento é uma salada ideológica sem foco e pode levar para qualquer lugar. Respondi que vivemos uma salada ideológica faz tempo. Privatizações, leilões de petróleo, parcerias público-privadas em que o dinheiro é público e o lucro privado não são práticas que se possa chamar de esquerda. Nem “mais ou menos”. É neoliberal mesmo.

Um modelo de desenvolvimento, com políticas neoliberais só pode resultar no que resultam todas as políticas neoliberais: alguns muito ricos e muitos muito pobres num Estado falido. Essa salada só poderia gerar outra salada como a que saboreamos agora. Os esforços do Estado brasileiro estão hoje voltados para promover negócios acreditando que muitos negócios giram a economia e desenvolvem o país. Mas que tipo de país? PIBão mal distribuído não é medida séria.

O povo que está indo às ruas é aquele que, quando adoece, procura o SUS e encontra o inferno, o sofrimento, a doença e a morte. Experimentem estar com suspeita de câncer e ter que esperar um ano para fazer um exame, depois mais um ano para começar a tratar, quando o tumor dobra de tamanho a cada dois meses.

Quem está indo para a rua são pessoas que frequentam escolas públicas sucateadas e, com sorte, entram na faculdade sem os conhecimentos básicos para seguir adiante. São jovens que chegam ao mercado de trabalho e só encontram subempregos na forma de estágios, operadores de telemarketing, ou trabalhos temporários, no mais das vezes sem carteira assinada.

Depois de dez anos de governos que foram eleitos para ser o antídoto às políticas neoliberais dos dez anos anteriores, claro que houve avanços. Claro que coisas melhoraram. Claro que podia estar muito pior.

Poderíamos ter entrado na ALCA como queriam os tucanos. Lula enterrou a ALCA. Poderíamos estar pendurados na economia estadunidense como os tucanos nos deixaram. Lula mudou o rumo das nossas relações internacionais e a crise estadunidense passou ao largo. Tivéssemos mantido a política tucana teríamos falido duas vezes.

Em vez disso  deixamos de ser capachos do G8, criou-se o G20, Lula alinhou o Brasil com os emergentes no BRICS. Hoje a América Latina chama atenção do mundo com transformações políticas e sociais graças à unidade regional construída por uma política de integração baseada na solidariedade e não no imperialismo, para a qual o papel do Brasil foi fundamental. Fossem os tucanos talvez já tivéssemos declarado guerra à Bolívia a mando dos EUA, teríamos isolado a Venezuela e voltado as costas à Argentina e ao Uruguai.

A mídia, principal partido da direita, bem que se esforça nesse sentido. Mas se tudo isso mudou a geopolítica da nossa região, no plano interno o projeto econômico é um modelo neoliberal com temperos sociais. O que melhorou para o povo que está nas ruas, é muito menos do que melhorou para grandes empresários nacionais e corporações estrangeiras que atuam no país, em especial no agronegócio.

Não se pode negar a existência de corrupção, mas é calhordice afirmar que ela existe por causa do PT que exerce a presidência. Entretanto, o modelo de Estado corrupto que sempre existiu não tem sido atacado nem enfrentado com a necessária energia. Ao contrário, é tolerado em nome de alianças para a “governabilidade”. 

Não existe mais corrupção do que sempre existiu, e, embora também tenha os seus casos, o PT não é um partido que se caracterize pela corrupção como são a maioria dos demais da base aliada e da oposição. É contra esse modelo de Estado e de política que o povo está na rua, ainda que aparentemente não tenha uma formulação logicamente elaborada a respeito. É um inimigo quase invisível, pois está impregnado na sociedade como um parasita e como tal precisa ser atacado.

Este modelo está impregnado não só nas obras da Copa, mas em todas as demais obras públicas, está impregnado no Bolsa família depois que o programa passou a ser controlado pelas prefeituras e não mais pelos comitês populares. Está impregnado no sistema de saúde pública que gasta muito mais com burocracia e negócios do que com saúde. A corrupção lá embaixo, nas prefeituras e nos estados não é do PT porque é mínimo o número de prefeituras e estados dirigidos por petistas comparado com os partidos tradicionais.

Entretanto, o futuro não está perdido. Diz um ditado da minha terra que quando um cavalo passa encilhado a gente monta. A grande crítica da esquerda aos governos petistas é que em vez de buscar no apoio organizado e politizado dos movimentos sociais as condições de legitimidade para governar com mudanças, se afastou deles e se aproximou dos partidos tradicionais que não querem mudanças. Depois da primeira eleição de Lula, o governo passou a evitar mobilizações sob alegação de que poderiam sair de controle e apostou na desmobilização.

O povo não acordou ontem. A última das massivas mobilizações populares foi a grande marcha dos 100 mil a Brasília encabeçada pelo MST (não pelo CANSEI) com a participação de todos os sindicatos, centrais, entidades estudantis, organizações populares e movimento comunitário. Foi numa marcha contra o modelo neoliberal de FHC, do PSDB e do PFL que virou DEM que virou PSD. Aquele movimento resultou na eleição de Lula para mudar e sepultar o modelo neoliberal de muito lucro para poucos e cada vez menos direitos para muitos.

Mas em vez de continuar assentando sua legitimidade nos movimentos sociais que o elegeram, no plano interno o governo passou a atacá-los começando pela a Reforma da Previdência quando eliminou direitos dos servidores públicos para atender as reivindicações do mercado financeiro. A medida era tão neoliberal que PSDB e PFL votaram junto com o governo, afinal era seu programa.

A maioria das entidades sindicais combativas que atuavam no campo da CUT, sofreu um sucateamento ideológico e deixaram de defender os interesses de classe que deveriam representar. A legitimação do governo passou a ser garantida através de acordos com setores conservadores que se opõem a mudanças.

A CUT pagou o preço, mas os trabalhadores  também. Todo o dia subsídios são distribuídos aos bilhões na forma de desonerações fiscais, financiamentos do BNDES ou dos bancos públicos a empresários que ficam mais ricos. Os serviços públicos são vistos como um negócio a ser explorado por empresários privados.

Projetos só são aprovados se vão gerar lucros escorchantes para alguém. Quando se fala em tarifa Zero para transporte coletivo ninguém do governo pensa em estatização das empresas, mas em subsídios para o lucro delas permanecer intacto. Subsídio passou a ser sinônimo de garantia de lucro para empresários e apenas secundariamente de promoção de direitos sociais.

É contra os efeitos práticos visíveis desse tipo de política invisível a olho nu que as pessoas estão nas ruas. Daí a confusão, daí a salada, daí a direita estar tentando se apossar de um movimento legítimo. Aqueles que chegaram ao poder com uma proposta de esquerda, mas adotaram um modelo de governança de direita estão agora encurralados entre este modelo e os efeitos dele sobre a sociedade que reclama já tardiamente.

O ponto de desequilíbrio do sistema não chega com hora marcada. Eu estava em Brasília no domingo em que, de uma hora para outra, as pessoas sairam expontaneamente à rua vestindo preto e pedindo o impeachment de Collor que tinha pedido verde e amarelo em sua defesa. Nenhum sindicato convocou, nenhum movimento organizado marcou data.

Quando se viu aquela massa na rua tomando a cidade os carros de som de sindicatos começaram a aparecer, meio no susto, para puxar a imensa carreata. O que aconteceu naquele domingo foi desproporcional em relação às mobilizações organizadas pelo movimento Fora Collor que avançava muito lentamente. De repente explodiu. O mesmo aconteceu em várias outras capitais e poucos meses depois Collor caiu.

Caiu Collor, derrubado por amplas mobilizações populares, mas não caiu o projeto neoliberal.  Assumiu Itamar, o vice, que nomeou FHC Ministro da Fazenda. Ele iniciou as reformas neoliberais, privatizações, ataques a direitos e dali pulou para mais 8 anos de presidência durante os quais foi responsável pelo maior saque ao patrimônio público já realizado na História do Brasil. Tudo registrado em detalhes em “A Privataria Tucana”.

Então veio Lula para nos redimir! Fez uma política externa irretocável, mas colocou o tucano Meirelles no Banco Central e deu-lhe autonomia de fato, reformou a previdência atacando direitos dos servidores, continuou as privatizações com outro nome. Colocou o conservador Palocci para dirigir a economia no melhor estilo neoliberal.

Mesmo assim, foi atacado o tempo todo pela mídia que tentou derrubá-lo sempre que pode, mas só começou a debater um marco regulatório no último ano de governo na Conferência Nacional da Comunicação. As propostas, no entanto continuam engavetadas e a mídia raivosa conspirando o tempo todo sem submeter-se sequer aos limites estabelecidos pela Constituição como a proibição de oligopólios e a complementariedade dos sistemas estatal, público e comercial abrindo espaço para o contraponto.
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Não foi a direita quem começou as mobilizações, mas é ela, com auxílio luxuoso da sua mídia, quem já tenta se aproveitar da situação. Imagens assustadoras de violência, incêndios, vandalismo, perda de controle, são elementos de propaganda para dizer que é hora de mudar (para as mudanças deles). Nada mais previsível e lógico. É óbvio também que os EUA estão apostando na desestabilização de um governo que acabou com a ALCA e ajudou a construir a unidade da América Latina. Estão loucos para recuperar o seu quintal e os seus negócios.

Tudo isso é verdadeiro, mas também é verdade que as mobilizações que tomaram o país formam o cenário perfeito para o governo assumir o rumo para o qual foi eleito há dez anos, retomar a aliança com os movimentos sociais e com apoio deles e das mobilizações que já assustam todos os políticos, mandar para o Congresso os projetos de democratização da mídia, de taxação das grandes fortunas, de aplicação do dinheiro público sem intermediários em politicas de transporte público, habitação, saúde e educação. Empresários podem trabalhar para o governo como contratados por obra certa.

Essa história de “parceiros” onde o governo entra com o dinheiro e os empresários ficam com o lucro desvia a maior parte dos recursos de seus verdadeiros fins, para o bolso dos “parceiros”. É difícil fazer isso com acordos de gabinetes, mas com povo na rua é outra coisa. O governo tem que decidir se insiste no modelo conservador neoliberal de gestão do Estado, ou se avança com o apoio dos movimentos sociais. Ainda dá tempo, mas, para isso, terá que escolher entre permanecer com alguns de seus atuais aliados ou se aliar definitivamente com o povo. Chavez, Evo, Correa, Mujica e Cristina escolheram o povo.

E agora Dilma? Que dilema! As alternativas de uma escolha errada é ser derrotada pela direita por não ter feito um governo de esquerda ou correr mais para a direita para se manter no poder cada vez mais refém dos acordos de gabinete. Ambas seriam uma tragédia. Na Europa, quando os “socialistas”, no poder, se transformaram em neoliberais, perderam a confiança dos cidadãos, entregaram seus países para a direita e deu no que deu.

É preciso coragem e muita firmeza. Há momentos em que é preciso dar um grande passo e apostar nas massas. Todas as grandes mudanças na História foram feitas assim. Passos tímidos não mudam nada e, no mais das vezes levam a tropeços. O povo ai está cobrando este passo.

Se o governo montar neste cavalo encilhado, seguirá fazendo História. Se continuar com medo do galope, ficará a pé e não será perdoado.

Caio Teixeira - Jornalista (As charges são do grande Latuff) 

terça-feira, 11 de junho de 2013

A mídia e a greve

Uma olhada atenta para o telejornal, na hora da principal refeição do dia, pode detalhar aquilo que bem já sabemos sobre o comportamento da impressa na cobertura de pautas relativas às lutas dos trabalhadores. Engasga, mas não derruba. O Jornal do Almoço dessa tarde, apresentando uma cobertura jornalística isenta - em teoria - foi impoluta. Ouviu todos os envolvidos e colocou em primeiro plano o direito de ir e vir da população.

Certamente, podemos dizer que cumpriu com os preceitos básicos do jornalismo clássico. Neutralidade. Objetividade. Compromisso com as pessoas. Mas, aquele telespectador inquieto não deixou passar batido. Um breve olhar atento sacou que a postura nem estava nas entrelinhas, a linha sempre esteve bem traçada. O pano nem era de fundo, nem mesmo era a toalha da mesa. Na superfície, no prato e no microfone, o asco como trata a prática sindical, justa e legal.

A reportagem, que traz levantamentos detalhados sobre horas e dias de paralisações e greves passadas desde 2002, não apresenta ao telespectador que o dispositivo da greve é a única alternativa de trabalhadores que recebem R$ 8,16 por hora de trabalho, enquanto o empregador, somente de isenção de impostos, 6 milhões ao ano. De isenção. Não estamos falando de lucro, menos ainda de mais-valia. Essa última, a impressa nem mesmo conhece a origem da palavra.

A mesma cobertura jornalística, impecável do ponto de vista conservador, mostra a "covardia" dos grevistas e enaltece o fura-greve, aquele que também vai receber no seu mísero salário todos os benefícios conquistados pela batalhas conduzidas pelos colegas. E os trabalhadores, todos eles, têm a seu favor apenas o seu próprio contingente. Em defesa de nossos interesses nem poder judiciário, legislativo ou executivo. Mas, é na defesa da população que levantam-se as vozes da "impressa livre". E assim, colocam a população contra a própria população. Em nome dos próprios interesses.

Portanto, o que se pôde ver na cobertura do JA, foi o esforço plástico de busca impertinente por uma objetividade e uma neutralidade abstrata, que servem a lei do livre mercado, em que a RBS é prestadora de serviço público (o direito a informação para quem não lembra) e o confere tendo em primeiro plano o capital e o poder. Aliás, capital é poder. E poder é mais capital.

Então, na impecável cobertura que trouxe à margem todos os ângulos da notícia, surgem criações estereotipadas sobre trabalhadores furiosos, enveredando pelos caminhos do "radicalismo" e da ilegalidade. E uma imprensa séria, também estereotipada, que defende o povo, mas o faz sob a égide da culpabilização do próprio povo. Imprensa fada-madrinha, que limpa a barra do patrão e do governo, parte do mesmo grupo de poder. Bem-vindo à hegemonia. Do capital, da mídia, dos jogos de palavras.

O JA nos dá uma importante lição de como manter as coisas como estão. E o fazem todos os dias, criando pseudo-indignações populares para justificar a grande passividade social que são responsáveis por manter. A autodenominação neutra, imparcial e objetiva é uma posição, em defesa do hegemônico, de uma classe que não é a que pertence a maioria de nós.

Clarissa Peixoto - Jornalista

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Antídoto contra a manipulação da realidade pela mídia


Perguntei a Marilena Chauí qual o antídoto contra a manipulação da realidade processada cotidianamente pela mídia. A resposta abaixo foi o início da conversa com uma das mentes mais lúcidas deste nosso Brasil:

 "Eu creio que a imunização pode ocorrer em duas situações. Uma é aquela na qual o grau da enganação por parte dos meios de comunicação ultrapassa o limite da contradição. Então entre o que eles inventam e a realidade cotidiana há uma contradição tão profunda que você passa a não acreditar na comunicação. Essa é uma possibilidade e a gente já viu coisas acontecerem nesta linha. Na segunda guerra do Golfo, isto ficou evidente. É o ponto em que a mídia ultrapassa o limite no qual ela poderia conter a contradição entre ela e a realidade. Quando ela ultrapassa esse limite, ela é vencida".

A entrevista completa está em:  http://criticadaespecie.com/

Caio Teixeira - Jornalista

domingo, 2 de junho de 2013

Fenaj se une a Paulo Bernardo para sabotar projeto de regulação da mídia

O Presidente da Federação Nacional dos Jornalistas-Fenaj, Celso Schöeder publicou artigo condenando a campanha de coleta de assinaturas por um projeto de lei de iniciativa popular lançado no último dia do trabalho pelo Fórum nacional Pela Democratização da Comunicação e grande número de entidades.

Schöeder sustenta que o assunto é importante e que precisa ser melhor discutido com base nas deliberações da conferência da comunicação de 2009. Ele está certo. O assunto precisa ser melhor discutido e colocá-lo na pauta do Legislativo com apoio da sociedade, é a melhor forma de fazer essa discussão o mais ampla possível.

A direção da federação está preocupada porque Fenaj não está sendo protagonista da luta pelo marco regulatório. Eles controlavam o FNDC para não fazer nada e foram tirados da cadeira pelos setores que queriam avançar na luta. Só estavam lá para dizer que ocupavam o “cargo” e colocar no currículo. Ativismo zero. Só politiquinha de conchavo de gabinete com deputado.

Nunca vi chamar mobilização, não vi fazer campanha, acho que não vi nem o assunto pautado nos boletins da Fenaj com a importância que o tema tem e que Schröder parece ter descoberto agora. Falo de muito antes de ser lançado o projeto de lei popular que está sendo a primeira mobilização de massa e instrumento para colocar o assunto em discussão com a sociedade desde que eu ouvi falar do FNDC.

Ah!, dirão alguns, mas quem está na cabeça do FNDC é a CUT e a CUT é governista. Sim, já fez coisas horríveis e pode fazer de novo. Mas qualquer militante mais antigo na estrada terá visto também que a política para a comunicação mudou da CUT e da inércia anterior passou a bater de frente com o governo inculisve em luta aberta com o Paulo Bernardo que não quer nem discutir agora.

Longe de querer defender a CUT, não sou cutista, o FNDC reúne o que há de melhor na luta pela mídia livre no Brasil e a participação da central tem sido consciente e honesta como as das demais entidades e movimentos.

O presidente da Fenaj diz que o assunto deve ser melhor discutido e tem mesmo, todos sabemos. Diz também que a tática correta é pressionar o governo e não fazer abaixo assinado. Está certo pela metade. Temos que pressionar o governo e para que isso aconteça alguém tem que colocar o tema na rua, na pauta da sociedade. O governo já disse que não vai fazer isso. Temos que pressionar o governo. Este é o papel do projeto de iniciativa popular.

Estamos lidando com um governo que tem dado porrada até nos servidores públicos que são muitíssimo mais organizados que os jornalistas e fazem greve todos os anos. Pressão tem que ser pressão pública, pressão com argumento, pressão que coloca o debate político para a sociedade.

Pressão para que o governo envie o projeto do Franklin Martins baseado na Conferência da Comunicação e que está na gaveta da mulher do Paulo Bernardo. A querida Gleise que chorou comovida a morte do dono da Veja semana passada. O que Schröeder propõe? Nada, como sempre.

Fenaj continua morta. Talvez prefira conscientemente dar o prazo que o Paulo Bernardo pediu até depois das eleições presidenciais. Afinal o Schröeder é companheiro de Paulo Bernardo na Articulação Sindical. São gatos do mesmíssimo saco em ideias e em política. Ao condenar o priojeto, o presidente da Fenaj está ajudando Paulo Bernardo a acabar com qualquer mobilização que possa pautar o tema na sociedade com força, antes da eleição, objetivo do governo e dos donos da mídia.

A proposta de conseguir as assinaturas é prá valer. Todas as entidades e movimentos que há anos lutam por uma midia livre estão envolvidos e é só gente séria. Muitos desses lutadores estão lado a lado no movimento de oposição à direção da Fenaj.

A campanha das assinaturas é sair do marasmo com a política correta: se a Dilma não pauta, o povo pauta. Não nos queixamos sempre da falta de participação popular nesta democracia representativa fajuta? Pois estamos usando uma das poucas armas institucionais que temos e para a qual nunca demos muita atenção.

A direita Venezuelana tentou derrubar o Chavez com um projeto de iniciativa popular: a convocação pelo povo de um plebiscito revogatório. Pena que não tem aqui. Não para derrubar este ou aquele, mas para que quem esteja no poder saiba que precisa andar ao lado do povo. É uma arma poderosa que pode ser usada para politizar e organizar a sociedade. Muito mais que reuniões de sábios iluminados em gabinetes de Brasília, se é que isto vem sendo feito pela Fenaj.

Quem verdadeiramente defende a luta pela democratiuzação da comunicação sabe que sem pressão nada muda.

A posição retrógrada da Fenaj só atende os interesses dos que querem adiar o debate sobre marco regulatório, no caso o governo e os milionários empresários da comunicação.

A hora de mobilizar para avançar é agora, antes das eleições para que o povo possa ver quem está do lado da mídia corrupta e quem quer democratizar a comunicação. Esta posição tem que ser denunciada e enfrentada. Que se desmascarem já.

Caio Teixeira - Jornalista

sábado, 1 de junho de 2013

CNJ investiga participação de magistrados em curso em Orlando

O Conselheiro Gilberto Valente Martins do Conselho Nacional de Justiça deferiu pedido formulado pela Federação Nacional dos Servidores do Judiciário nos Estados – FENAJUD e determinou que todos os Tribunais de Justiça do país informem se enviaram magistrados para participar de curso de segurança pessoal, ministrado no exterior.

A FENAJUD ingressou como parte interessada no PCA n. 0001760-57.2013.2.00.0000 originado pelo Sindicato dos Servidores da Justiça do Estado do Maranhão - Sindjus/MA requerendo providências quanto ao pagamento de passagens e diárias a magistrados do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão para participar de curso de defesa pessoal fora do país.

De acordo com o relatado pelo Sindjus/MA na petição inicial, o judiciário Maranhense aprovou o envio de um grupo de juízes aos EUA, a fim de participar do curso “Sistemas e Técnicas de Segurança Aplicadas ao Poder Judiciário” em Orlando na Flórida, conhecida mundialmente por seus parques temáticos.

O referido curso de segurança pessoal denominado “Judicial Swat”, é ministrado pela empresa americana US POLICE INSTRUCTOR TEAMS (US-PIT), com sede na Red Rose Cicle, 142, Cidade de Orlando, Estados Unidos da América. O primeiro grupo já participou do curso em Orlando no período de 01 a 05 de abril deste ano.

O Conselheiro determinou ainda que os Tribunais de todo o país informe se os magistrados e servidores participaram de qualquer outro curso semelhante, realizado no exterior. Bem como, informem também em que momento se deu o envio, quais as motivações para fazê-lo e a quantidade de juízes ou servidores enviados. A determinação do Conselheiro Gilberto Valente Martins foi publicada no dia 22 de maio e os tribunais têm o prazo de 15 dias para atendê-la.

Notícia no site do TJMA confirma o envio de pelo menos 40 magistrados, entre desembargadores e juízes criminais, inclusive aqueles que já sofreram algum tipo de ameaça. De acordo com o texto, o curso - com tradução simultânea - foi ministrado por policiais da ativa da SWAT, unidade de polícia altamente especializada, formada por policiais equipados e treinados para reduzir risco associado a uma situação de emergência.

Uma das participantes, a juíza auxiliar da Corregedoria, Márcia Coelho Chaves, ressalta a importância do curso para os magistrados: "Nós tivemos a oportunidade de vivenciar experiências que jamais poderíamos experimentá-las aqui. Foi um curso único, grandioso. Cada magistrado voltou com uma mentalidade diferente, não só a título de segurança pessoal, mas institucional", afirma.

Josemar Sehnem - Jornalista


Veja o despacho do Conselheiro Gilberto Valente Martins:

Vistos, etc.

            Trata-se de requerimento avulso formulado pela Federação Nacional dos Servidores do Judiciário nos Estados - FENAJUD.

            A entidade pleiteia seu ingresso no feito como parte interessada.

            Alega que o tema objeto do PCA n. 0001760-57.2013.2.00.0000 consiste em matéria de interesse geral da categoria que representa, podendo, desta feita, gerar efeitos aos seus associados, inclusive em outros estados da federação. Ressalta que situação semelhante à relatada pelo requerente na inicial já foi identificada no Estado do Rio de Janeiro.

            Por fim, requer a intimação de todos os Tribunais de Justiça do país, para que informem se enviaram juízes ou servidores para participarem de curso de segurança pessoal semelhante ao noticiado na peça inicial, realizado no exterior, bem como que informem em que momento e quais as motivações para fazê-lo.

            É o breve relato. Decido.

            Defiro o ingresso da entidade requerente acima identificada como interessada.

            Outrossim, defiro o seu pleito referente à intimação de todos os Tribunais de Justiça do país, a fim de que informem se enviaram juízes ou servidores de seu quadro de pessoal para participação em curso de segurança pessoal, denominado “Técnicas e Sistemas de Segurança Aplicáveis ao Poder Judiciário” – realizado em Orlando – EUA, ministrado pela empresa americana US POLICE INSTRUCTOR TEAMS (US-PIT), com sede na Red Rose Cicle, 142, Cidade de Orlando, Estados Unidos da América – ou em outro curso semelhante, realizado no exterior. Bem assim, informem em que momento se deu o envio, quais as motivações para fazê-lo e a quantidade de juízes ou servidores enviados.

            Prazo de 15 (quinze) dias.

            Aguarde-se as informações a serem prestadas pelos Tribunais de Justiça do país. Após, nova conclusão.

            À Secretaria Processual para providências.

            Brasília, 22 de maio de 2013.

 
GILBERTO VALENTE MARTINS
Conselheiro

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Cautela antes de brindar ao novo ministro do STF

Assim que a notícia da nomeação do novo membro do STF circulou entrei no site do nomeado para descobrir quem é o escolhido. O advogado constitucionalista e professor Luis Roberto Barroso defende casamento entre pessoas do mesmo sexo, aborto dos fetos anencefálicos, pesquisas com células tronco e defendeu Cesare Batistti. Vai muito bem nas questões estritamente morais.

Preocupou-me seu posicionamento nas questões econômicas e “de mercado” que em última instância definem as condições de opressão na sociedade. No site pessoal do novo ministro, http://www.luisrobertobarroso.com.br/, temos acesso a seus pareceres e descobrimos que o advogado recém-nomeado trabalhou recentemente para setores importantes da economia.

Para o governo do RJ, por exemplo, defendeu a tese da inconstitucionalidade da lei que definiu a nova divisão dos royalties do petróleo. Esta lei, ainda que tenha problemas, estendeu a todos os estados os benefícios de uma riqueza do povo brasileiro (o petróleo do pré-sal), ao invés de transformá-la em privilégio de dois ou três estados, dentre os quais seu cliente o Rio de Janeiro.

Advogou também recentemente para a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas para quem escreveu tese defendendo a constitucionalidade da publicidade de produtos com alto teor de açúcar, gordura ou sódio (sal), utilizados indiscriminadamente pelas empresas do ramo como forma de reduzir custos e aumentar lucros.

Tal prática é reconhecida pelas autoridades de saúde pública como comprovadamente causadora de uma epidemia de obesidade infantil no Brasil. Utilizou o argumento de que proibir qualquer publicidade seria um tipo de censura e ataque à liberdade de expressão e que, portanto, outras formas de precaução devem ser propostas. Não sugeriu nenhuma.

Luiz Roberto também escreveu tese contra a possibilidade do Ministério Público participar de investigações criminais. Para isto, tentou sair pela tangente. Sustentou que a Constituição não permite nem proibe, mas como a polícia está subordinada ao Ministério Público que pode em tese controlá-la. Quem controlaria o Ministério Público? Portanto, conclui o jurista, é preciso regulamentar o assunto e assim concluindo abre caminho para a tramitação e aprovação da chamada PEC da Impunidade.

Um de seus últimos trabalhos foi defender a utilização de terminais portuários privados para uso público. Embora pareça uma bobagem aos menos avisados, tal medida na prática tem o significado jurídico de permitir a privatização dos portos recém-aprovada pelo Congresso.

Segundo a legislação vigente, empresas que utilizam portos para transporte de seus próprios produtos, podem manter terminais privados exclusivos, mas não podem prestar serviços a terceiros. É uma meia privatização.

A medida defendida por Luis Roberto atende os interesses dessas de transformá-los em terminais privados prestadores de serviços altamente lucrativos e se associarem com as grandes operadoras internacionais. É a privatização total.

Estes são alguns posicionamentos do novo Ministro do STF no campo econômico acerca dos quais não li nenhuma referência nos elogios feitos a ele pela mídia em geral. Talvez não sejam importantes.

Há outra coisa intrigante para dizer o menos. Quem conhece o “mercado jurídico” sabe que cada parecer de um jurista de renome capaz de influenciar julgamentos em tribunais, como os recentes trabalhos do Senhor Luis Roberto, custa de R$ 500.000,00 a R$ 1 milhão ou mais, pois envolvem possibilidades de lucros infinitamente maiores para os interessados contratantes.

Ainda que tais valores possam ser maiores, fiquemos com eles pois são suficientes para concluirmos o raciocínio. Ministros do STF, como é sabido, devem ter dedicação exclusiva à magistratura, sendo-lhes vedada a atuação em escritórios de advocacia onde poderiam ser contratados para elaborar pareceres.

Do fundo de minha ingenuidade, fico admirado com o desprendimento de pessoas que abrem mão de uma situação financeira extremamente confortável para encarar, como um sacerdócio, uma carreira que vai restringir seus ganhos a menos de R$ 250.000,00 líquidos anuais que é o salário de um ministro do STF.

Para que se tenha ideia do tamanho dos interesses envolvidos nos portos, por exemplo, saibam que um Prático (profissional que guia os navios na entrada dos portos) ganha em média por mês o que um Ministro do STF ganha em um ano. Já fiz um documentário sobre portos e afirmo que o prático é um pequeno peão no grande jogo de lucros dos operadores do setor.

Há quem diga que homens íntegros sabem agir de acordo com a posição em que se encontram. Enquanto advogado, Luis Roberto tem a obrigação ética de defender os interesses de seus clientes, mas enquanto membro de um Poder do Estado, defenderá o interesse público.

A dúvida que me assalta é se uma mesma pessoa pode seguir uma ética quando servir ao mercado e outra quando servir ao interesse público. Sempre pensei que Ética fosse uma coisa única.

Como votará Luis Roberto quando o STF julgar a constitucionalidade da propaganda de produtos prejudiciais à saúde? Como votará na ação que vai questionar a privatização dos portos? Como votará na ADI que questiona a nova repartição dos royalties do petróleo? Saberá separar as coisas? Saberá separar o interesse público do interesse de seus antigos clientes? Saberemos em breve, embora então já seja tarde para criticar.

Talvez digam que é um vício esquerdista achar que o sistema capitalista pode ser a causa da degradação moral por que passa a sociedade humana. Talvez seja ingenuidade minha não perceber o quanto de bom o novo ministro vai trazer ao STF, o que é perfeitamente possível e não me envergonha.

Mas, por prudência, antes de abrir espumantes para comemorar a nomeação do “Defensor de Direitos Humanos” parece ser conveniente olhar melhor para a totalidade dos fatos que compõem a história deste senhor.

É conveniente também atentar para o fato de que a nomeação de ministros de tribunais superiores no Brasil de hoje, longe de configurar a busca de pessoas com “notável saber jurídico e reputação ilibada” como reza a Constituição – seja lá o que isso for – nada mais é do que um ato de repartição do poder entre as forças econômicas que dirigem a política.

De qualquer forma, sem nenhuma pretensão de ser dono da razão, lanço minhas preocupações como mera provocação na expectativa de ouvir em troca argumentos inteligentes capazes de construir conhecimento o mais próximo possível da realidade a respeito do novo Ministro e, quem sabe, erguer minha taça para brindar. Por enquanto, em respeito à dúvida, mãe da sabedoria, suspendo o juízo e deixo a taça sobre a mesa.

Caio Teixeira - Jornalista

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Imprensa Vigilante, sociedade em marcha e as pombas no balaio

Maior demonstração não há de que, para o Poder, pouco importa imprensa, cidadão ou entidade e organização vigilantes. 

Na página 8 do Diário Catarinense de 20 de Maio, numa daquelas famosas matérias para alisar egos, o DC diz que a RBS produzirá série sobre o Pacto por Santa Catarina. 

Primeira, é ela falando dela mesma. Segundo: o pacto por Santa Catarina é obra do atual governador com o seu governo. 

Quem nasceu na Coxilha Rica prefere ver turista passeando em cavalinhos em lugar de convocar o morador do andar de baixo para um tal “governo participativo”. Mofas com a pomba no balaio, povo!

A matéria do DC, cujo título diz que a RBS produz a série, já de cara informa no lide que o RBS Notícias exibe nesta semana... Bom, produzir vem antes de exibir, suspeita-se. E o leitor que se dane. 

O lide explicita que a série se dá pelo um ano do anúncio do Pacto e que as reportagens registram o que está acontecendo em todas as regiões do Estado (até mesmo em Maracajá, Turvo e Paial? Duvido).

A primeira matéria da série, no caso apresentada dia 20 de Maio pela RBS TV, mesma data em que o título da matéria do DC afirmava que a série seria produzida, traz um fato que é digno de estar logo nas primeiras linhas porque, da técnica jornalística é realçar de pronto a importância do morto, ou o número de mortos. 

Pois não é que a primeira matéria da RBS TV exibiu “os avanços em Infraestrutura”, conforme o texto original, “onde...” (sic) – onde? Lugar? 85% das ordens de serviço já foram assinadas!!!

Dois anos e meio de governo, um ano de Pacto e o governador já assinou 85% das ordens de serviço!!!  Não foi trabalho demais, não? Depois desta comovente notícia que afeta a vida de todos nós, catarinenses, resta perguntar se ele conseguirá assinar as outras 15% de ordens de serviço faltantes antes de começar a cata por votos para a próxima eleição...! E a pomba, no balaio, a mofar!

Como não poderia deixar de ser, a matéria da RBS TV, conta o DC, também afirma que há motivo pelo qual o Pacto não anda e os gargalos que não se desfazem. O jornal não apresenta os tais problemas. O leitor que se vire e a pomba que se empombe. 

No dia 21, relata o jornal, a RBS apresentaria matéria sobre um tal Regime Diferenciado de Contratações. A ideia deste Regime é que o governo possa “driblar” (sim, isso mesmo, foi esse o termo utilizado) a burocracia para que as obras saiam do papel. 

A abertura de 3 mil vagas no sistema prisional seria uma das soluções viáveis pelo Regime Diferenciado. A matéria também  não explica como.

A matéria do DC avança com precisão, afirmando que quarta-feira, dia 22, serão abordados os desafios que o programa (o Pacto) enfrenta nos próximos meses.


Pois bem: a matéria ilustra algumas inutilidades. Uma delas, a da falta de coisa real na própria matéria. A outra, que este governo da Coxilha Rica assina ordens de serviço a rodo e tem imaginação para driblar a burocracia (deve ser a própria burocracia, ou seria a do Tribunal de Contas?). 

 Enfim, que nos próximos meses seremos bem informados sobre o Pacto. Será? A partir pela demonstração, acho que não. 

Afinal de contas não se deve usar tantos “pode”, “deve”, “vai” e quetais em texto jornalístico. 

Ou será que a Imprensa Vigilante só tem um olho, e justo e coincidentemente aquele que agrada apenas ao governo...

Rubens Lunge - Jornalista

quinta-feira, 11 de abril de 2013

FENAJUD quer que CNJ impeça pagamento retroativo do auxílio-alimentação a juízes em todo o País

A Federação Nacional dos Servidores do Judiciário nos Estados (FENAJUD) ingressou no processo que questiona no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) o pagamento retroativo do auxílio-alimentação para a magistratura catarinense.

O secretário-geral da Federação, Volnei Rosalen, disse que a FENAJUD busca impedir o pagamento retroativo em todos os Estados. O pagamento retroativo do auxílio-alimentação de juízes foi questionado, primeiramente, pelos Sindicatos de Servidores de Santa Catarina e da Paraíba.

Uma liminar contra o pagamento foi expedida na quinta-feira passada (4) pelo relator do processo, o conselheiro nacional de justiça Bruno Dantas. A medida alcançou apenas o Tribunal da Paraíba. 

Em Santa Catarina, a administração do Poder Judiciário movimentou recursos administrativamente dia 2 de abril e ordenou o depósito de R$ 25 milhões dia no mesmo dia da liminar de Dantas. 

O Conselho Nacional de Justiça requereu explicação ao Tribunal de Santa Catarina.

Rubens Lunge - Jornalista

terça-feira, 9 de abril de 2013

Salário de desembargador X salário de trabalhador

Determinado desembargador barriga-verde recebeu R$ 239.929,42 líquidos de setembro de 2012 a fevereiro de 2013 - média mensal de R$ 39.988,23, ou o equivalente a 58,97 vezes o salário mínimo nacional. Ou seja, um assalariado precisaria trabalhar quase cinco anos para acumular o que foi recebido pelo desembargador em meio ano. 

O salário-dia deste togado foi de R$ 1.817,64 no período (levando-se em conta que são 22 dias úteis no mês, mas esquecendo-se do recesso). Por hora, o povo pagou R$ 259,66 ao magistrado. Se recebesse por hora, trabalhando sete horas por dia, o salário-hora de um trabalhador que recebe mínimo seria de R$ 4,40.

Rubens Lunge - Jornalista

segunda-feira, 8 de abril de 2013

O jornalista, a cruz e a espada

Nesta semana comemoramos o dia do jornalista. Entre felicitações e votos de uma vida repleta de pautas, coberturas, fatos e notícias, uma pergunta não sai do pensamento: dada as reflexões democratizantes sobre os oligopólios midiáticos, como deve localizar-se esse profissional que tem na ética e na liberdade de expressão do pensamento seus principais pressupostos num mundo regido pelo capital financeiro?

É fato que não temos uma resposta pronta. Por um lado, é preciso complacência com a classe trabalhadora, entendendo que é complexo sobreviver do próprio trabalho em meio à selva capitalista contemporânea. No entanto, nada fácil é entender que nós, jornalistas, ao termos uma profissão essencialmente ligada a um direito constitucional, nos submetamos a certos ditames por condições estritamente particulares.

Ainda que submetidos às leis do mercado, seja para morar, comer ou até rezar, é responsabilidade do jornalista não calar-se frente ao objeto do seu trabalho, a informação. O texto, a versão do fato e a análise não são apenas produtos do trabalho. Para produzi-los, o jornalista dispõe de informação, tê-la requer privilégios. E isso é hegemonizar, isso é concentrar poder. E quanto menos clareza e responsabilidade sobre a informação, mais se cerceia o povo de seus direitos. E assim, seguimos omissos, mantendo as coisas todas em ordem. Na ordem que serve a poucos em detrimento de muitos.

Na semana anterior, a vitória da Rede Globo sobre o jornalista Azenha, do blog Viomundo, deixa perplexo quem não se convence com Willians e Fátimas. E, de novo, seguimos impotentes. O questionamento demite. O exercício da liberdade de opinião é passível de processo. E processa mais quem tem poder financeiro e controle da caneta da justiça. Une-se a isso o poder da última versão, única e massiva. O final feliz é para poucos.

E a pergunta do início ainda está aqui, latejando na mente e no coração. O jornalista e o oligopólio podem conviver harmonicamente? Parece-me que uma profissão, por essência transformadora, não poderia conviver com o atrasado e imutável. Poderia? Então, ela já não é mais a mesma.

Clarissa Peixoto - Jornalista

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Culturas, glórias e resistência



O melhor de circular por países diferentes é perceber que apesar da festejada globalização do consumo, as pessoas resistem e preservam suas culturas, incluindo seu jeito de ser.

As marcas e as lojas são as mesmas em todo lugar, mas as pessoas conseguem se manter diferentes, ainda que consumam, de um modo geral as mesmas coisas e frequentem shopping centers e supermercados em que até as gôndolas de mercadorias são dispostas da mesma forma. Apesar disso tudo, há uma parte do humano que o mercado não consegue atingir, por mais que tente. A cultura é uma forma de resistência da espécie às formas desumanas de exploração que impõem modelos artificiais de organização das sociedades.

Os italianos, os franceses, os espanhóis ou os tchecos tem orgulho de serem exatamente como são, de ter sua História e suas glórias. Alguém poderá observar que as “glórias” não são mais que momentos de triunfo das elites de cada tempo, de reis, da igreja, dos ricos. Não é dessa glória, escrita na História pelos vencedores que estou falando. Essa é uma glória feita de conquistas predatórias e intencionalmente fratricidas.

Falo de uma outra glória, uma glória que não ficou enclausurada nos livros de História, mas se faz presente, viva e insurgente em todos os tempos. Falo da glória dos rebeldes à qual pouco espaço se reserva nos livros editados pelo mercado.

Falo da glória desse povo de Paris que resistiu e defendeu sua cidade quando os reis, covardes, abandonaram a capital diante de invasão estrangeira, deixando os pobres súditos à própria sorte. Falo daqueles parisienses que livres de um rei inútil repeliram os invasores e, no pouco tempo que tiveram, estabeleceram a primeira experiência de sociedade baseada na solidariedade e não na exploração, no poder exercido diretamente pelas pessoas, independentemente de suas posses materiais, mas simplesmente porque são humanas e devem ter direitos iguais.

Falo da glória do povo espanhol que enfrentou a ditadura franquista com poderio militar infinitamente inferior, porque preferiram arriscar-se a morrer com dignidade do que permanecerem sob o tacão de uma tirania cruel.

Falo da glória do povo italiano que derrotou um regime de oligarquias para instaurar sua República, liderados por Garibaldi que temperou sua bravura em terras farroupilhas lutando ao lado de Bento e Neto com seus lanceiros negros.

Não importa se a Comuna de Paris foi derrotada por uma aliança de classe entre o rei e os invasores. Não importa se os revolucionários espanhóis tiveram que cruzar os Pirineus, derrotados para novamente reunir forças no exílio. Não importa se os tchecos amargaram um longo inverno depois de sua primavera insurgente. Não importa se os farroupilhas não conseguiram sustentar sua república ou que os lanceiros negros tenham sido covardemente assassinados.

A glória que traz orgulho aos povos é a de ter lutado pela sua liberdade toda vez que algum tirano tentou se apossar de coisas que não tem dono. A glória que traz orgulho e se mistura ao gen é a glória de ter escolhido a luta contra o opressor muitas vezes mais poderoso com a certeza na frente a História na mão.

Esta glória é a matéria primeira das culturas que resistem quando tudo em volta afirma que é inútil a revolta. Culturas forjadas assim, não são feitas de feiras de artesanatos ou belas arquiteturas. Em cada tijolo de um prédio que nos enche os olhos de beleza, em cada cor, em cada peça esculpida ou pintada, está presente uma história de luta.

Então, sempre que encontrar um povo que encara de frente, que tem o estranho hábito de não baixar a cabeça e que se orgulha de ser o que é, respeite-o e aprenda uma lição. Ele não está sendo arrogante ou petulante, nem se acha melhor que os outros. Quando um povo olha de frente é porque sabe que tiranias só triunfam quando o povo olha para baixo, não enfrenta o inimigo e foge da luta.

Nossa América do Sul, por conta de Venezuela, Equador e Bolívia, hoje é exemplo de insurreição para o velho mundo. Para encerrar este texto, não consigo escapar das palavras do General San Martin, que já escrevi mil vezes: “El enemigo siempre parece más grande quando se lo mira de rodillas”. O inimigo sempre parece maior quando o encaramos de joelhos.

Caio Teixeira - Jornalista

terça-feira, 19 de março de 2013

Florianópolis já tem seu Conselho Municipal de Juventude

No fim de tarde do dia 14 de março, o Conselho Municipal de Juventude foi nomeado pela primeira vez na história de Florianópolis. Inicia-se uma nova etapa da luta dos movimentos ligados à juventude na cidade.

O momento político é positivo. Nos últimos anos, políticas públicas para esse segmento têm sido constituídas, amparadas pelos marcos das duas Conferências Nacionais de Juventude, respectivamente ocorridas em 2008 e 2011. No entanto, os desafios ainda são inúmeros, como enfrentar as desigualdades e os problemas com os quais convivem os/as jovens de Florianópolis e Santa Catarina.

A vitória da juventude florianopolitana - e por que não catarinense, tendo em vista que o Estado não conta com o conselho estadual similar? - é reflexo de mobilizações e debates que perpassaram os últimos dez anos. Organizações de todos os matizes, que compõem o quadro dos movimentos sociais de juventude, atuaram para a construção de novos paradigmas, o que reflete hoje nessa primeira nomeação de conselheiros e conselheiras.

A instalação da Coordenadoria Municipal de Juventude - não se faz aqui juízo de valor sobre a sua atuação -, precede em alguns anos a existência prática do Conselho e avança ao colocar a juventude em espaço de visibilidade, no qual pode-se pensar e propor as suas pauta. Mas, transformá-la em secretaria é uma das expectativas que precisam estar no horizonte do poder público de Florianópolis.

A título de conhecimento e reconhecimento, a Lei 8452/2010 institui o Conselho Municipal de Juventude. Em pouco mais de dois anos, é colocada em prática, mas ainda apresenta-se incipiente. A representação da sociedade civil é pequena, embora paritária aos membros que compõem a participação do poder público, e ainda não reserva espaço para outros segmentos que participam da vida da juventude na cidade.

Os desafios partem da necessidade de colocar Florianópolis na mesma "mão" em que caminham as políticas públicas de juventude no Brasil, garantindo direitos e visibilidade. A tarefa será enfrentar as dificuldades, as divergências e os preconceitos, constituir a luta de ideias e primar pela pluralidade. Equidade, é o queremos.

Clarissa Peixoto - Jornalista

quarta-feira, 13 de março de 2013

Por que ainda lutam as mulheres?

Dia 8 de março é marcado pelas comemorações das conquistas femininas ao longo da história, mas é, sobretudo, dia de reflexões e luta. No Brasil, a equidade de gênero, embora apresente avanços, ainda é um desafio a ser superado.

Representamos mais de 51% da população brasileira. No entanto, nossa participação política é muito pequena. Na Câmara Federal, dos 513 deputados eleitos, apenas 44 são mulheres. Esses dados apontam para uma diferença gritante, que deve ser superada com medidas do estado e organização da sociedade.

Nesse sentido, a reforma política se coloca como essencial. Seus marcos, se vitoriosos do ponto de vista da equidade de gênero, apresentarão às mulheres brasileiras avanços no campo político e social. Nessa data de lutas, defendemos a ampliação dos direitos, diminuindo o abismo entre homens e mulheres, fator preponderante para alcançarmos níveis de maior desenvolvimento social e consolidarmos nossa democracia.

Nós, feministas brasileiras, também nos somamos às vozes que, em todo o mundo, se levantam contra os fundamentalismos. Hasteamos a bandeira da tolerância, da defesa dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, da liberdade religiosa, da livre orientação sexual, contra o racismo e o preconceito em todas as suas formas. O conservadorismo, amparado por preceitos religiosos unilaterais, não pode ser a baliza de um estado democrático, laico e que deve primar pela pluralidade de ideias e ampliação de direitos.

O retrocesso não será bem-vindo a 2013, mantemos ao alto nossas bandeiras de liberdade, justiça social e tolerância. Que outros 8 de março possam ser de conquistas para as mulheres!

Clarissa Peixoto - Jornalista