segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Banco de horas do Tribunal de Justiça de Santa Catarina é ilegal e imoral


Uma resolução do gabinete da presidência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina de 29 de janeiro é um atentado contra as relações de trabalho, a liberdade e a representação sindical, e propõe a regulação de um instrumento legal e a compreensão que a sociedade vem dando à tese que o origina e a sua prática no mundo real à subordinação e submissão do que pensa um desembargador.

A Resolução GP N6, que institui o banco de horas no âmbito do Poder Judiciário catarinense, é mais um dos exemplos da arrogância com que o mundo do trabalho pode ser observado a partir das salas acarpetadas de quem tem poder nos Poderes da República.

Primeiro, porque a resolução não condiz com a realidade do serviço público catarinense, e menos ainda, com a do Poder Judiciário, uma vez que a administração sequer reconheceu até o momento a necessidade de realização e pagamento da hora extra. O Tribunal não admite, mediante a regulamentação do pagamento da hora extra, que servidores façam sobrejornada, quando de fato ela existe e não tem pouco tamanho.

E segundo, porque somente uma imperiosa necessidade de usar a mão-de-obra, por conta da enormidade do trabalho a ser feito e pela impossibilidade de novas contratações de trabalhadores que o façam, com o risco iminente da “quebra” do Tribunal de Justiça, poder-se-ia declarar a oportunidade de estabelecimento de uma relação em que os trabalhadores deixam de receber salário (justamente porque a fonte pagadora encontra-se sob o risco de não ter recursos) e o trocam por folga. 

Pelos balanços anuais e previsões orçamentárias vê-se que o Tribunal de Justiça não tem problemas para pagar salários. Aliás, nem salários, nem auxílio-moradia, inclusive atrasado, para os togados, e quiçá, em breve, auxílio-alimentação, também, num movimento de milhares de reais nas contas bancárias de poucos do “time de cima”.

A resolução do Tribunal de Justiça perdeu a oportunidade de permanecer no imaginário de quem deseja o serviço público uma fábrica e uma linha de produção em massa, desconsiderando a finalidade objetiva do Poder, que é a prestação do bom atendimento no campo do Direito para que a sociedade possa “funcionar”.
Entenda a Lei

O banco de horas foi criado pelo governo de Fernando Henrique Cardoso através da Lei 9.601/98, que alterou o Artigo 59 da CLT.

O objetivo do banco de horas é flexibilizar as relações de trabalho e de pagamento da mão-de-obra. A justificativa para a implementação do banco de horas e de que, para evitar demissões em massa de trabalhadores e a quebradeira de empresas, melhor seria manter o emprego, ganhar o mesmo salário e trabalhar mais, produzindo mais, e por isso fazendo o preço do produto custar menos para o patrão.

Tendo em vista a ponderação de que vivemos numa democracia, a lei que proporciona o uso do banco de horas determina limites para a sua aplicação. Nesta tese, o banco de horas somente é legítimo se verificada a possibilidade real de dispensa em massa de trabalhadores porque o empregador está em risco. A outra é o pagamento efetivo das horas extras do banco por folga.

Vale ressaltar e, mais do que isto, evidenciar, realçar e chamar a atenção para o seguinte: o banco de horas somente pode ser aplicado se houver acordo em Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho com a participação do Sindicato da categoria representativa. A quantidade de horas trabalhadas, horários, período e forma de compensação do banco de horas, entre outros direitos, devem estar claros na Convenção.

E mais: a decisão de implementação de banco de horas ou sistema de compensação também deve ser discutida e votada, geralmente por aclamação ou voto secreto, com os trabalhadores, pois são eles os maiores interessados no acordo e nos efeitos sobre suas vidas que as jornadas extraordinárias e as suas compensações provocam.

Por esta e por outras, o Poder Judiciário de Santa Catarina deveria se atualizar e estabelecer novas conexões com o mundo – mais democrático – em que vivemos.

Rubens Lunge - Escritor e Jornalista 

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